Castelo Garcia D’Avila, de 1624. À época, a maior construção residencial das Américas. |
- Já são 7 horas da noite e você ainda não me enviou as suas impressões sobre a Praia do Forte!
- Pra quê? Algumas fotos já te darão a impressão daquele maravilhoso lugar. Além do mais, você já esteve por lá tantas vezes...
- É verdade! A primeira foi em 1972. Chegar até a Praia do Forte era uma aventura nos anos 70. O lugarejo abrigava apenas pescadores, e o turismo ainda era palavra desconhecida para os poucos habitantes – era coisa de gente da cidade.
- Sim, mas isso não quer dizer nada. Hoje em dia, o local está lindo, bem equipado com belas pousadas, lojas com produtos nacionais e importados, bares simpáticos à beira-mar, enfim, um verdadeiro paraíso tropical.
- Pois é, meu amigo! A minha leitura é outra. Considero a Praia do Forte vítima da especulação imobiliária, da sede do ganho fácil representada pela presença de consumismo supérfluo que, aos poucos, vai descaracterizando a pequena aglomeração.
- Como assim?
O Projeto TAMAR – referência mundial na luta pela preservação das tartarugas marinhas. |
Igreja de São Francisco de Assis, de 1900. Quase na areia da praia. |
- Preste atenção aos guarda-sóis na praia. Amarelos, ostentam a publicidade acintosa do cartão de crédito Visa, que impõe a sua marca numa proporção descabida e indevida, enfeando o ambiente.
- É. Mas e sem eles?
- Sem eles?! Certamente os diretores de marketing da bandeira querem tirar proveito e dizer, com esse torpedeamento publicitário, que a Praia do Forte é a "praia" do cartão Visa! Provocam, assim, essa invasão visual, essa poluição estética, esse desrespeito aos habitantes e aos visitantes também.
- Porém, a sinalização turística está adequada, se comparada a outros locais deste País, você não acha?
- Não! Nas indicações turísticas, em placas de madeira, o absurdo começa pelo nome dos estabelecimentos: "Forte Rent a Car", em vez de Locadora Praia do Forte; "Beach House", em vez de Casa da Praia; "Point do Ivan", no lugar de Encontro do Ivan; "Yellow Cat", em vez de Gato Amarelo; "New Bahia", em vez de Bahia Nova... Isso, por si só, diz tudo!
Publicidade imiscuindo-se no cenário natural. |
A busca de uma padronização visual na sinalização. |
- Diz tudo o que? Acho que você é extremista! Isso ocorre por todo o Brasil!
- Sei disso, e é o que me entristece! A Bahia tem seus exóticos orixás, os pescadores têm seu próprio vocabulário, a fauna e a flora ostentam nomes magníficos que certamente poderiam servir como inspiração para os donos das lojas, dos restaurantes, das pousadas e de outros pontos comerciais... Entretanto, insistem em se apresentar como um povo complexado, que imita o ser americano, esse sim, povo autêntico e seguro de si!
- Isso é xenofobia!
- Xenofobia coisíssima nenhuma! Isso é brio! É orgulho de falar uma das línguas mais ricas, variadas e expressivas do mundo! É pudor diante de tantas macaquices desses pseudo-intelectuais globalizados, que pensam que inserir vocábulos americanos na razão social das empresas e nas fachadas dos estabelecimentos comerciais os torna mais eficientes, produtivos, competentes e melhores!
Bares e restaurantes para todos os gostos e bolsos. |
Mutirão para a limpeza da praia. Pena que isto ainda seja necessário! |
- Mas o que tudo isso que você diz tem a ver com a Praia do Forte?
- Vou te responder com algumas perguntas: Quantos desses turistas que você fotografa visitam o Forte Garcia D'Ávila? Quantos se interessam por sua história e pela cultura local como, por exemplo, pelo espetacular carnaval do vilarejo? Quem deles se preocupa com a comunidade local ou com a preservação da natureza naquele entorno?
- Bom... A Petrobrás, por exemplo, patrocina o Projeto Tamar, que foi iniciado por um alemão que construiu o belíssimo EcoResort Praia do Forte!
- Você quer dizer "Hotel de Lazer" Praia do Forte, não é mesmo? Pois é! Dizem que esse senhor, mui espertamente, aguardou o momento oportuno para vender suas terras aos investidores portugueses, espanhóis e outros que estão, literalmente, invadindo essa porção do litoral norte da Bahia e construindo complexos hoteleiros com centenas de aposentos. É mais esgoto a ser jogado no mar, mais consumo de energia, mais emprego para forasteiros e pouco retorno às comunidades locais. Você sabia que esses hotéis de praia nessa região do litoral baiano interferem gravemente na desova das tartarugas marinhas que aqui põem seus ovos há milhares de anos e que se encontram em séria ameaça de extinção? Devíamos dar um basta em tudo isso! Mas talvez já seja tarde demais...
Artista comercializa a sua criação: animais esculpidos em coco. |
- Eu sei, meu amigo! É por isso que eu não te encaminhei as minhas impressões. Adoro a Praia do Forte! Lá eu me sinto feliz quando afundo meus pés em suas areias e mergulho de corpo e alma em suas águas transparentes e límpidas!
- Entendo, respeito e admiro o seu otimismo. Mas para quem, como eu, viveu a Bahia autêntica antes da chegada desta intrusão mercantilista, fica difícil manter diálogo por causa de nossas diferentes experiências. Tomara que, daqui a trinta anos, você não sinta a mesma frustração que eu senti ao retornar à Praia do Forte, e que o Brasil e os brasileiros tenham conseguido recuperar certos valores. Se já não for tarde demais...
- Eita!!!
Siga o Varginha Online no Facebook, Twitter