Que guerra é essa que a gente não ganha? Testemunho uma criança perguntar e, assim como ela, também me espanto. E vou além: existe algo que fica de fora do discurso oficial do combate ao Aedes aegypti, mosquito transmissor do zica e do chikungunya, além dos vírus causadores da dengue e da febre amarela.
Será mesmo que voltaremos a erradicar o mosquito apenas pedindo para que as pessoas retirem a água dos pratinhos e virem suas garrafas?
Após duas erradicações, já se passaram mais de 40 anos desde que o mosquito voltou a assolar o País. Ao longo desse período, o engajamento da população tem sido a principal estratégia de combate ao mosquito que já faz parte do folclore da saúde pública brasileira. Convivemos diariamente com o empenho da TV e os seus jornais em responsabilizar as pessoas pela abundância de focos. O script é sempre o mesmo: destemidos agentes de endemias escarafunchando bairros em busca de focos, reclamando da parte da população que não os atende e lembrando que só o esforço de todos tem êxito no combate ao transmissor do zica, chikungunya e dos vírus da dengue e da febre amarela. Sem esquecer, é claro, o depoimento de uma dona de casa que diz estar fazendo sua parte e que os vizinhos precisam fazer o mesmo.
Mas o que, então, precisa ser revisto?
1) Responsabilização: a Administração Pública passa ao largo dessas matérias. Em um roteiro de favas contadas, a culpa é do fulano ou fulana, patifes que não limpam seus quintais. Não pensem que estou passando pano para a falta de educação do nosso país.
2) Protagonismo: o combate ao Aedes aegypti é, antes de qualquer outra coisa, uma questão política e precisa ser tratado como tal.
3) Visão limitada do problema: o hall das informações ofertadas fica restrito há um discurso raso que tem se demonstrado pouco efetivo. O Aedes aegypti é também uma questão socioeconômica. Quanto mais senso comum usamos para lidar com a questão, mais o mosquito se prolifera.
Em 2019, Minas Gerais registrou mais de 480 mil casos prováveis, apenas de dengue, com 171 mortes causadas pela doença. É necessário pensar a saúde pública em toda a sua complexidade para entender o que nos faz conviver há tanto tempo com esse mal. É claro que o engajamento da sociedade é fundamental no combate ao nosso “mosquito de estimação”, mas é só a sociedade que precisa se engajar?
Se o empenho das administrações fosse em produzir conjuntamente os serviços públicos, envolvendo de fato a população na gestão, nossos índices de sucesso seriam certamente maiores. Pois apontar para a sociedade e dizer que a responsabilidade é nossa não está funcionando. Ou seja, agir no sentido da restruturação de conselhos comunitários, equipando e incentivando para que estes operem a fim de atender as demandas de seus respectivos bairros. Mas isso interessa a gestão pública? Responda você.
Por fim, cabe ressaltar que o combate ao Aedes aegypti passa pela coleta e tratamento de resíduos sólidos, passa por saneamento básico e infraestrutura de bairros periféricos, passa por educação, passa por iniciativa política.