Ouço a ventania sacudir os galhos das frondosas árvores do jardim da Sede velha de madeira. Escuto o coaxar dos sapos, o cantar dos grilos, a sinfonia das pererecas no infinito da noite. Percebo o piado de um pássaro desgarrado prenunciando a chuva, o temporal, as águas abençoadas que alimentarão as terras férteis da Fazenda Santa Marina.
Adormeço à luz da lamparina, que diminui ao consumir o querosene que a abastece. Ouço ao longe o mugir de uma vaca, o ladrar de um cão sonolento, o abrir e fechar de uma porteira.
Assusto-me com o raio todo-poderoso; percebo o seu clarão no horizonte, pelas frestas de uma janela entreaberta; mergulho em um sono profundo e sonho com as águas límpidas do córrego cercado de vegetação intensa, exuberante, mato fechado, com dezenas de espécies nativas, pequenas flores singelas, cipós entrelaçados e torcidos que parecem testemunhar a força da mãe Natureza.
Acordo, repleto de energia, com o levantar do sol. Tomo banho de bica, saboreio o leite morno fresquinho, tirado na hora. Acompanho o apartar do gado, percorro as plantações de milho e os cafezais.
Cavalgo pelos pastos, converso com o colono, ouço os seus causos, as suas história e o seu saber como Homem do Campo.
Colho frutas do pomar. A laranja apetitosa, a manga madura, a mexerica docinha, o abacaxi suculento, a banana quase madura de um cacho esquecido ao relento de uma bananeira generosa; sinto o cheiro do frango caipira na panela de barro, descanso na rede da varanda em uma tarde calorenta...
Naquela época não se falava em ''turismo rural''. Estávamos em 1968, a 80 quilômetros de Araçatuba e a algumas léguas de Pereira Barreto. São recordações (imersas em um passado longínquo) submersas nas águas do Rio Tietê, as quais inundaram as terras outrora férteis que deram lugar à Barragem de Três Irmãos.