Em um dia frio do mês de fevereiro de 2018, adentro um pequeno restaurante na Capital Portuguesa, a elegante Lisboa, e encomendo o bacalhau cozido da casa.
- ''Sugiro o bacalhau grelhado, é muito melhor'', argumentou a proprietária do restaurante, uma senhora loura, meia idade e aparentemente tensa.
- ''Prefiro o bacalhau cozido, pode ser?'', argumentei.
- ''O grelhado é muito melhor'', reafirmou a mal humorada servente.
- ''Mas o bacalhau cozido me traz recordações de minha finada mãe'', argumentei.
Olhando para o lado, mirando o teto e fechando a cara, ela exclama: ''pois que coma então o cozido!!!''
Em um calorento dia do mês de outubro, do mesmo ano, encontro-a no mesmo local e ordeno o mesmo prato, por fidelidade culinária e respeito as pequenas tradições que carrego em meu âmago.
Recordei-me então que, há nove meses atrás, o prato de bacalhau cozido foi-me servido e, olhando fixamente a senhora, perguntei - ''posso fazer um comentário sobre o bacalhau cozido?'', amedrontada, quase apavorada, a senhora olhou-me atentamente e respondeu secamente - ''pois não, faça-o!''
- ''O prato estava delicioso!''
- ''Vejam, vejam, escutem o que disse o cliente! Que o bacalhau estava delicioso, delicioso disse ele!!!'' e, aos prantos, fazia todos do restaurante ouvirem, ''ele disse que o bacalhau estava delicioso''.
A união do sabor impecável e o resgate de sensação de antanho fizeram-me reviver o precioso momento de felicidade e de reencontro com sabores e saborosas vivências degustativas.
Neste calor de fim de verão, no mês de outubro de 2018, espero novamente pelo bacalhau cozido e já se passaram mais de vinte minutos que aguçam a minha fome e a minha curiosidade.
Chega o prato. Veio cozido, mas não veio ensopado. Novamente, mergulho na linha do tempo ao relembrar-me dos momentos prazerosos vividos em convívio familiar em alguma Sexta-feira Santa perdida na linha do tempo. Volta-me à mente os dias em que estava enclausurado no Colégio Salesiano Dom Luiz Lasagna, em que raramente uma tia vinha visitar-me. Neste curto período de alforria ficou a imagem, também, do bacalhau cozido servido pela gorda e simpática mulata Joana, serviçal da grande casa.
Passa-me pela mente: Sou portanto um privilegiado errante por viajar nos mundos físico e virtual, no presente e na linha do tempo passado ao reunir, na busca de sensações perdidas, sentimentos emoldurados e preservados que me garantem a satisfação dos momentos por vir.
Em fevereiro de 2019 devo encontrar-me novamente na Capital Portuguesa para descobrir, vislumbrar e registrar o leito de nascimento e de morte de Pedro de Alcântara Francisco António João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon.