Coluna | Periscópio
Wender Reis
Pedagogo e Orientador Social, curioso observador de tudo que causa espanto no mundo.
Não chame a polícia, chame os direitos humanos
03/08/2017


A cena estarrecedora do policial Marcos Marques da Silva, 37, cabo da PM de Minas Gerais, sendo alvejado por um tiro de fuzil na cabeça, comoveu, e novamente colocou em evidência a estupidez nossa de cada dia. O confronto desproporcional entre os PM’s e os bandidos foi praticamente transmitido ao vivo em nosso reality show, que está cada vez mais show e menos reality, nas redes sociais. 

No fluxo da instantaneidade com que os acontecimentos repercutem, surgiram imediatamente arautos da justiça responsabilizando os direitos humanos por ter provocado a tragédia. Em contrapartida, meia dúzia de haters, infelizes e oportunistas, atiçaram ainda mais a sanha justiceira dos comovidos. E novamente, perdemos mais uma excelente oportunidade de discutir o papel da polícia, a eficácia da guerra ao tráfico de drogas, que é o pai da criminalidade no país, e as razões de estarmos assistindo a tantos policiais sendo mortos Brasil afora. 

A mídia que, por sua vez, não sabe mediar discussões, pautando apenas os discursos de endurecimento da guerra contra a criminalidade em face daqueles que defendem uma polícia mais humanizada, deu pico de audiência ao favorecer o primeiro. Afinal, é o que a maioria quer ouvir, não? Contudo, enquanto a discussão se limita dizeres caducos, omissos e rasos, policiais continuam sendo mortos. É preciso, pois, entender, antes de mais nada, a guerra por trás da guerra. 

Para além do bem e do mal, a polícia, mais precisamente os seus agentes, os policiais, são as maiores vítimas dentro de um sistema penal que, no contexto de um país que recrimina a pobreza, sem antes tentar preveni-la, arrasta os policiais para uma guerra que não deveria ser da polícia. Esta íntima relação dos policiais com o o crime gera consequências trágicas que passam despercebidas da opinião pública. São suicídios, depressão, síndrome do pânico e outras tantas patologias que essa atividade de guerra provoca. O número de suicídios chega a ser maior que o número de policiais mortos em combate. Ora, se são conhecidos os terríveis efeitos entre os ex-combatentes de guerra que testemunharam o conflito de forma temporária, evidente que quem vivencia a guerra diária e sem trégua sofre de forma mais intensa os efeitos desta atividade insana. Mas dois caminhos são quase inevitáveis: a corrupção e o embrutecimento, ou seja, a animalização de seus membros. 

E por isso mesmo, não podemos perder de vista que essa guerra, da maneira como se apresenta, não pode continuar. Dos 50 mil homicídios ocorridos no país por ano (números de uma guerra civil), apenas quatro mil (8%) têm o autor descoberto e preso. Por óbvio, em linhas gerais, a polícia não consegue e não está voltada para prevenir e nem reprimir delitos. 

Portanto, quem mais precisa dos direitos humanos, é própria polícia, que esta lutando no lugar errado, exposta e vulnerável.

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