Coluna | Fatos e Versões
Rodrigo Silva Fernandes
Advogado e articulista político do Jornal Gazeta de Varginha. Escreve todas as quartas e sextas.
O Casamento
29/06/2012


Dizem que o casamento é um importante passo a ser tomado na vida, que é preciso que o noivo e a noiva tenham total afinidade. Além disso, é sabido que quando se casa, também se deve “levar” a família do cônjuge junto. Ou seja, é fundamental o bom relacionamento com a família da pessoa escolhida.

Diz a sabedoria popular que “deve-se comer um saco de sal com a pessoa escolhida, antes de casar”. Afinal, um casamento onde as famílias e os noivos se estranham ou não se conhecem, esta fadado ao insucesso.

O certo mesmo, é que para construir um bom casamento é preciso que as famílias que vão se unir sejam amigas, parceiras e que este bom relacionamento seja honrado e profícuo para que os noivos possam “ser felizes” no casamento.

A coluna fez esta introdução para contar uma história que se passou há muito tempo na cidade de Vargem Pequena, com o Senhor Ave do Azar, da Família Petralha.

O senhor Ave já havia se casado há 4 anos, e depois de um relacionamento tumultuado, cheio de traições e disputas, o senhor Ave se separou. Há quem diga que a separação traumática teria sido em razão da intromissão da Família Petralha no casamento. Afinal, o Senhor Ave era amigo de infância da pessoa escolhida para o primeiro casamento. A Família Petralha era muito difícil, sempre lutou muito por um casamento bom para o Senhor Ave do Azar, que embora já maduro era extremamente inseguro e não liderava seu casamento ou sua casa. Tudo na vida do Senhor Ave do Azar era comandado por sua intrometida Família Petralha.

Depois da primeira separação, o Senhor Ave ficou muito triste. A típica situação de um homem abandonado se abateu sobre o Senhor Ave, a casa ficou sem arrumação, o lixo juntava pelos cantos. Não havia ordem ou comando na casa do Senhor Ave.

E todos que moravam junto ao Senhor Ave sofreram também, pois a casa estava sem dono, o Senhor Ave já não mais administrava nada, precisava urgentemente de outra “esposa” para recomeçar a vida e arrumar a casa.

Enquanto a “ex-mulher” do Senhor Ave ainda xingava o ex-marido e sua Família Petralha pelos cantos, a Família Petralha já “maquiava” o Senhor Ave e anunciava que estavam à procura de uma nova noiva para o “distinto senhor”. Naquele momento o Senhor Ave tinha contra si o peso do primeiro casamento fracassado e outros históricos de maus casamentos na família, mas como o Senhor Ave possuía “casa própria confortável e garantida por 4 anos e muitos serviçais”, muitas donzelas e outras nem tão donzelas assim apareceram para tentar uma “vaga” de noiva do Senhor Ave.

Os serviçais da casa do Senhor Ave, se dividiam entre aqueles que lamentavam pela casa estar sem comando, aqueles que se entristeciam pelo Senhor Ave não reagir a imperativa vontade de sua Família Petralha e os muitos que torciam para que o Senhor Ave, mudasse de vez daquela casa e desse lugar a um novo casal, que cuidasse da casa e fosse zeloso e atencioso com os serviçais e todos que conviviam naquela região. A Família Petralha já não se demonstrava tão cordial com os serviçais da casa nem mesmo com a vizinhança. Já o Senhor Ave, por não liderar a casa, não tinha nada de zeloso!

Reunida a Família Petralha, tendo o Senhor Ave no canto da mesa, foi decidido que a próxima noiva e futura esposa do Senhor Ave precisava ser de “boa família”. Alguém que agregasse algo a já mandona e “empodeirada” Família Petralha, claro! Depois do primeiro casamento mal sucedido, o Senhor Ave, já não ligava muito para o amor, para ele bastava que a noiva viesse com o aval da Família Petralha e com o apoio de sua própria família.

Apareceram várias pretendentes, cada qual com sua virtude e defeito. A Família Petralha não queria perder nenhuma pretendente, afinal, se o Senhor Ave não tivesse um bom casamento logo, poderia perde o “nome e poder” conseguidos a duras penas pela Família Petralha. Além disso, um bom casamento iria garantir a “manutenção da casa” ocupada pela Família Petralha já há 12 anos. E passada ao comando do Senhor Ave, nos últimos 4 anos de seu triste primeiro casamento falido. Pelo andar da carruagem o Senhor Ave caminhava para ser despejado devido à baderna que se instalara e crescia na casa sem comando.

A primeira pretendente era conhecida do Senhor Ave, foi grande incentivadora do primeiro casamento, chegou até a trabalhar na casa do casal! Possuía liderança e habilidade para gerenciar a casa, e era bem quista por parte dos servidores da casa onde residia o Senhor Ave.

Realmente a primeira pretendente tinha suas virtudes, mas não se curvava aos desejos da Família Petralha, embora em seu coração sempre almejasse um casamento com o Senhor Ave. A primeira pretendente ficou ao lado do Senhor Ave por alguns anos e, nos bastidores, teria recebido “gracejos” do Senhor Ave, o que indicava que ela seria a escolhida para noiva, embora a Família Petralha tivesse restrições.

A segunda pretendente era muito formosa, porém desconhecida na cidade. Todos se perguntavam, quem é aquela mulher? Depois veio a se saber que a segunda pretendente além de formosa, pertencia a família nobre, com ligações poderosas na Capital Federal e que somaria muito dinheiro num eventual noivado e casamento com o Senhor Ave.

Por ser de família rica, a segunda pretendente era muito exigente. Para se relacionar com o Senhor Ave, exigia escolher os convidados do casamento e trocar boa parte dos serviçais da casa. Acostumado a receber ordens, o Senhor Ave não via problemas em se submeter às vontades da segunda pretendente, caso fosse ela a escolhida, como parecia já estar definido.

A terceira opção da Família Petralha e do Senhor Ave era uma pretendente franzina, que em pouco tempo apaixonou-se pelo conforto que poderia ter se realmente casasse com o Senhor Ave. Além disso, a terceira pretendente era de família tradicional e conhecida na cidade. Família numerosa e que renderia muitos aliados ao Senhor Ave na luta pela manutenção da casa por mais quatro anos, além de garantir apoio à Família Petralha. Porém na numerosa e tradicional família da terceira pretendente, havia uma filha mais velha, porém mais bonita e que sempre foi o xodó da família. A terceira pretendente, “doida pra noivar e casar” não contava que sua família se alegraria mais se conseguisse compromissar a filha mais velha primeiro. De tal sorte que a família da terceira pretendente manifestou a Família Petralha e ao Senhor Ave sua intenção de dar em noivado a filha mais velha e experiente e não a filha mais nova e assanhada. Além disso, a filha mais velha estava apta a suportar as duras penas de “aturar o Senhor Ave e a Família Petralha”, pois possuía o total apoio e amparo de sua família. Diferente da filha mais nova, que ainda se ensoberbecia fácil e não era afeta a democracia de sua família, nem mesmo se agradava de ouvir sua família e com sabedoria caminhar em grupo pelo bem comum.

O Senhor Ave tinha afinidade com a terceira pretendente, porém não escondia que sua irmã mais velha era muito mais valorosa e agregaria mais a sua intenção de restabelecer a ordem a sua casa e garantir limpa e confortável moradia por mais 4 anos. A Família Petralha também via a irmã mais velha da terceira pretendente com olhos gananciosos. Sabia que somente a filha mais velha poderia agradar toda a família num eventual casamento.

Ensoberbecidos com as muitas pretendentes para o Senhor Ave, a Família Petralha prometeu noivado a todas as pretendentes, mesmo sabendo que apenas uma noiva poderia ser escolhida. O Senhor Ave, também desenganado e controlado pela família, dava vãs e enganosas esperanças a todas as pretendentes.

Com o tempo, a primeira pretendente começou a irritar-se com a demora na escolha e cobrava uma decisão do eventual noivado com o Senhor Ave. A segunda pretendente se fiava em sua fortuna para garantir o cobiçado noivo, a terceira pretendente passava dias a bajular o Senhor Ave e prometer fidelidade e união familiar. Claro que a terceira pretendente, vendo que sua irmã mais velha, a cada dia se tornava mais linda aos olhos da Família Petralha e do Senhor Ave, começou a invejar a irmã mais velha e querer seu mal.

Maldosamente, a irmã mais nova e assanhada maquinava contra a irmã mais velha; queria roubar-lhe a benção do casamento, mesmo que para isso tivesse que contrariar toda sua família.

Com a demora do Senhor Ave em definir uma noiva ou mesmo dizer a verdade as pretendentes, o tempo foi passando e as noivas foram ficando impacientes e frustradas com a situação. Com o tempo, toda a vizinhança tomou conhecimento que a casa do Senhor Ave estava de “pernas pro ar” e a futura noiva, teria grande trabalho para organizar e garantir a moradia por mais quatro anos. Além disso, os serviçais da casa, que já beiravam a loucura devido as incertezas e agruras do Senhor Ave e sua Família Petralha, fizeram correr aos quatro ventos que na casa do Senhor Ave, muitos esqueletos estavam nos armários. A nova esposa poderia inclusive comprometer sua honra, caso casasse com um noivo tão perdulário, sob o descontrole de família tão gastadeira como ocorria com a Família Petralha. Corria a boca pequena que a Família Petralha e o Senhor Ave já haviam comprometido toda sua fortuna e poder para chegar até a aquele ponto.

As pretendentes ficaram escandalizadas e a primeira delas já foi logo se afastando do Senhor Ave e sua família mandona. A primeira pretendente procurou amor nos braços de outro jovem senhor. Desta vez um homem probo, responsável e próspero cafeicultor na cidade. Já a segunda pretendente, vendo que a riqueza e poder do Senhor Ave e sua Família Petralha era só enganação, logo desistiu do casamento. Viu que só a sua fortuna seria consumida na união e que o crédito do Senhor Ave não lhe garantiria poder ou mais quatro anos de conforto.

Já a terceira pretendente, vendo o crescente assédio sobre sua irmã mais velha e o desejo de sua família em casá-la primeiro, revolta-se contra os valores da família e éticos. Num gesto inadequado para quem se diz uma donzela, a terceira pretendente, num entardecer de terça, se deita com o Senhor Ave.

No desespero de acabar sozinho e perder a casa e o poder, o Senhor Ave e a Família Petralha aceitam o ato libidinoso de fornicação. Pobre Senhor Ave, além de ter sua real situação de desespero e falta de apoio explicitada ao público, ainda desonrou a família da Terceira pretendente e ainda por cima conseguiu o descontentamento de toda a família da terceira pretendente e sua filha mais velha, que nem mesmo nutria amor pelo Senhor Ave.

Agora sem pretendentes, sem o apoio dos serviçais da casa e com sua situação financeira precária para permanecer no poder, o Senhor Ave e a Família Petralha agora teriam que carregar também o ônus de encontrar a solução para a terceira pretendente que fora deflorada e que não mais é aceita em sua família. Na já pesada Família Petralha, agora junta-se uma pretendente desonrada pela fome de “noivado, casa e poder”. Pobre Senhor Ave, não tem mais o desejo, amor ou interesse de ninguém. Conseguiu carrear o desprezo da primeira pretendente e sua família, ser esnobado pela segunda pretendente rica, que já não quer mais casamento. Finalizando sua trágica situação, o Senhor Ave agora também tem contra si e sua Família Petralha a fúria da família da terceira pretendente, que fora desonrada.

Mesmo que este ato libidinoso, entre o Senhor Ave e a terceira pretendente, gere um fruto da desonra, este relacionamento não terá mais o apoio da tradicional e numerosa família da terceira pretendente, que vai acompanhar de longe sua assanhada filha mais nova e o Senhor Ave descerem ao desespero de perder a casa, a honra e o pouco poder que lhes restam.

Em breve, a casa do Senhor Ave será habitada por outro casal. Deus queira que sejam pessoas distintas, honradas e que tratem bem dos serviçais e dos vizinhos. Assim todos ficaram felizes, menos a Família Petralha e o Senhor Ave, que achavam possível construir um casamento sem amor, respeito e companheirismo. O destino vai se encarregar de fazer do Senhor Ave, um solteirão infeliz e da assanhada terceira pretendente uma possível mãe solteira de vários rapazes, que passam pela vida e prometem poder e riquezas a moças tolas e gananciosas, que não terminam a vida bem!

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