Casos são a 4ª principal causa de morte entre pessoas de 15 a 29 anos
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que, todos os anos, mais de setecentas mil pessoas no mundo tiram a própria vida. No Dia Mundial da Prevenção do Suicídio, lembrado nesta terça-feira (10), a entidade - em parceria com a Associação Internacional para a Prevenção do Suicídio (IASP, na sigla em inglês) - alerta para a necessidade de reduzir o estigma e encorajar o diálogo sobre o tema.
Até 2026, a campanha que faz alusão à data - encabeçada por ambas as organizações - tem como tema Mudando a Narrativa sobre o Suicídio. A proposta, segundo a OMS, é romper com a cultura do silêncio e do estigma, dando lugar para a abertura ao diálogo, compreensão e apoio. Números da entidade mostram que o suicídio figura, atualmente, como a quarta principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos.
Em nota, a OMS cita consequências sociais, emocionais e econômicas de longo alcance provocadas pelo suicídio e que afetam profundamente indivíduos e comunidades. Para a organização, uma simples conversa é uma ferramenta com o potencial de contribuir para uma sociedade mais solidária e compreensiva, independentemente do tempo de duração desse diálogo.
Prevenção
Outro ponto de destaque da campanha é enfatizar a necessidade de se priorizar a prevenção do suicídio e a saúde mental em meio às definições de políticas públicas. A proposta é que ações de governo, de maneira geral, coloquem em primeiro plano o contexto da saúde mental, ampliando o acesso ao tratamento e também fornecendo apoio aos que precisarem.
Por fim, a OMS lembra que reduzir a taxa global de suicídio em pelo menos um terço até 2030 é uma das metas dos chamados Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, definidos pela Organização das Nações Unidas (ONU).
“Os desafios que levam uma pessoa a tirar a própria vida são complexos e associam-se a fatores sociais, econômicos, culturais e psicológicos, incluindo a negação de direitos humanos básicos e acesso a recursos”, destaca a organização.
O suicídio, para a entidade, pode ser impulsionado ainda por eventos registrados ao longo da vida e capazes de gerar tensão, como a perda de meios de subsistência, pressões no trabalho, rompimentos de relacionamentos e discriminação. “A meta é dedicar maior atenção ao problema, reduzir o estigma e aumentar a consciência de organizações, governos e o público ressaltando que os suicídios são evitáveis”.
Setembro Amarelo
No Brasil, uma das principais campanhas de combate ao estigma na temática da saúde mental é o Setembro Amarelo que, este ano, tem como lema Se precisar, peça ajuda.
Definido por diversas autoridades sanitárias como um problema de saúde pública, o suicídio, no Brasil, responde por cerca de 14 mil registros todos os anos. Isso significa que, a cada dia, em média, 38 pessoas tiram a própria vida.
Na avaliação de Héder Bello, psicólogo e especialista em Trauma e Urgências Subjetivas, transtornos mentais representam fatores de vulnerabilidade em meio à temática do suicídio – mas não são os únicos.
Ele cita ainda uma pessoa ser LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e queer), estar em situação de precariedade financeira ou social, ser refugiado político ou enfrentar ameaças, abuso ou violência. “Esses e outros fatores contribuem para processos de ideação (fase criativa) ou até de tentativa de suicídio”.
“Políticas públicas que possam, de alguma maneira, falar sobre esse assunto, sem tabu, são importantes. Instrumentos nas áreas de educação e saúde também podem ser amplamente divulgados – justamente para que a gente possa mostrar que existem possibilidades e recursos amplos para lidar com determinadas situações que são realmente muito estressantes e de muita vulnerabilidade.”
Abordagem
O psicólogo detalha ainda como abordar uma pessoa que pensa em tirar a própria vida. “Não é questionar a pessoa sobre o motivo daquilo ou dizer que ela tem que valorizar a vida, mas ouvir essa pessoa atentamente, tentar entender o ponto de vista dela e quais são os motivos que fizeram com que ela não conseguisse lidar de outras maneiras com a situação que está passando.”
“Isso nem sempre é fácil e, muitas vezes, nem profissionais da área da saúde e da saúde mental têm um treinamento mais extenso para lidar com essa questão de ideação suicida ou com as tentativas de suicídio”, concluiu.
No Brasil, o Centro de Valorização da Vida (CVV) é um serviço voluntário de apoio emocional e prevenção ao suicídio para quem precisa conversar. O atendimento está disponível 24 horas por dia pelo telefone 188.
Dados sobre suicídio
O suicídio é um importante problema de saúde pública, com impactos na sociedade como um todo. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde - OMS, todos os anos, mais pessoas morrem como resultado de suicídio do que HIV, malária ou câncer de mama - ou guerras e homicídios.
Entre os jovens de 15 a 29 anos, o suicídio foi a quarta causa e morte depois de acidentes no trânsito, tuberculose e violência interpessoal. Trata-se de um fenômeno complexo, que pode afetar indivíduos de diferentes origens, sexos, culturas, classes sociais e idades.
Segundo dados da Secretaria de Vigilância em Saúde divulgado pelo Ministério da Saúde em setembro de 2022, entre 2016 e 2021 houve um aumento de 49,3% nas taxas de mortalidade de adolescentes de 15 a 19 anos, chegando a 6,6 por 100 mil, e de 45% entre adolescentes de 10 a 14 anos, chegando a 1,33 por 100 mil.
As taxas variam entre países, regiões e entre homens e mulheres. No Brasil, 12,6% por cada 100 mil homens em comparação com 5,4% por cada 100 mil mulheres, morrem devido ao suicídio. As taxas entre os homens são geralmente mais altas em países de alta renda (16,6% por 100 mil). Para as mulheres, as taxas de suicídio mais altas são encontradas em países de baixa-média renda (7,1% por 100 mil).
Em países da Europa, houve um declínio nas taxas de suicídio e observou-se um aumento dessas taxas em países do Leste Asiático, América Central e América do Sul.
Embora alguns países tenham colocado a prevenção do suicídio no topo de suas agendas, muitos permanecem não comprometidos. Atualmente, apenas 38 países são conhecidos por terem uma estratégia nacional de prevenção do suicídio.
Quais as barreiras à detecção e à prevenção do suicídio?
Diversos fatores podem impedir a detecção precoce e, consequentemente, a prevenção do suicídio. O estigma e o tabu relacionados ao assunto são aspectos importantes. Durante séculos de nossa história, por razões religiosas, morais e culturais o suicídio foi considerado um grande “pecado”, talvez o pior deles. Por esta razão, ainda temos medo e vergonha de falar abertamente sobre esse importante problema de saúde pública. Um tabu, arraigado em nossa cultura, por séculos, não desaparece sem o esforço de todos nós. Tal tabu, assim como a dificuldade em buscar ajuda, a falta de conhecimento e de atenção sobre o assunto por parte dos profissionais de saúde e a ideia errônea de que o comportamento suicida não é um evento frequente condicionam barreiras para a prevenção. Lutar contra esse tabu é fundamental para que a prevenção seja bem-sucedida.
Mitos
Erros e preconceitos vêm sendo historicamente repetidos, contribuindo para formação de um estigma em torno da doença mental e do comportamento suicida. O estigma resulta de um processo em que pessoas são levadas a se sentirem envergonhadas, excluídas e discriminadas. A tabela 1 ilustra os mitos sobre o comportamento suicida. O conhecimento pode contribuir para a desconstrução deste estigma em torno do comportamento suicida.
1. O suicídio é uma decisão individual, já que cada um tem pleno direito a exercitar o seu livre arbítrio.
FALSO. Os suicidas estão passando quase invariavelmente por uma doença mental que altera, de forma radical, a sua percepção da realidade e interfere em seu livre arbítrio. O tratamento eficaz da doença mental é o pilar mais importante da prevenção do suicídio. Após o tratamento da doença mental o desejo de se matar desaparece.
2. Quando uma pessoa pensa em se suicidar terá risco de suicídio para o resto da vida.
FALSO. O risco de suicídio pode ser eficazmente tratado e, após isso, a pessoa não estará mais em risco.
3. As pessoas que ameaçam se matar não farão isso, querem apenas chamar a atenção.
FALSO. A maioria dos suicidas fala ou dá sinais sobre suas ideias de morte. Boa parte dos suicidas expressou, em dias ou semanas anteriores, frequentemente aos profissionais de saúde, seu desejo de se matar.
4.Se uma pessoa que se sentia deprimida e pensava em suicidar-se, em um momento seguinte passa a se sentir melhor, normalmente significa que o problema já passou.
FALSO. Se alguém que pensava em suicidar-se e, de repente, parece tranquilo, aliviado, não significa que o problema já passou. Uma pessoa que decidiu suicidar-se pode sentir-se “melhor” ou sentir-se aliviado simplesmente por ter tomado a decisão de se matar.
5. Quando um indivíduo mostra sinais de melhora ou sobrevive à uma tentativa de suicídio, está fora de perigo.
FALSO. Um dos períodos mais perigosos é quando se está melhorando da crise que motivou a tentativa, ou quando a pessoa ainda está no hospital, na sequência de uma tentativa. A semana que se segue à alta do hospital é um período durante o qual a pessoa está particularmente fragilizada. Como um preditor do comportamento futuro é o comportamento passado, a pessoa suicida muitas vezes continua em alto risco.
6. Não devemos falar sobre suicídio, pois isso pode aumentar o risco.
FALSO. Falar sobre suicídio não aumenta o risco. Muito pelo contrário, falar com alguém sobre o assunto pode aliviar a angústia e a tensão que esses pensamentos trazem.
7. É proibido que a mídia aborde o tema suicídio.
FALSO. A mídia tem obrigação social de tratar desse importante assunto de saúde pública e abordar esse tema de forma adequada. Isto não aumenta o risco de uma pessoa se matar; ao contrário, é fundamental dar informações à população sobre o problema, onde buscar ajuda etc.
Fatores de risco e de proteção
O reconhecimento dos fatores de risco e dos fatores protetores é fundamental e pode ajudar o profissional de saúde a determinar clinicamente o risco e, a partir desta determinação, estabelecer estratégias para reduzi-lo.
Os médicos ainda não podem prever exatamente quem irá se suicidar, mas podem tentar reduzir os riscos. O detalhado conhecimento dos fatores de risco pode auxiliar os médicos a delimitarem populações nas quais os eventos poderão ocorrer com maior frequência.
Os dois principais fatores de risco são
Tentativa prévia de suicídio:
É o fator preditivo isolado mais importante. Pacientes que tentaram suicídio previamente têm de cinco a seis vezes mais chances de tentar suicídio novamente. Estima-se que 50% daqueles que se suicidaram já haviam tentado previamente.
Doença mental:
Sabemos que quase todos os suicidas tinham uma doença mental, muitas vezes não diagnosticada, frequentemente não tratada ou não tratada de forma adequada. Os transtornos psiquiátricos mais comuns incluem depressão, transtorno bipolar, alcoolismo e abuso/dependência de outras drogas e transtornos de personalidade e esquizofrenia. Pacientes com múltiplas comorbidades psiquiátricas têm um risco aumentado, ou seja, quanto mais diagnósticos, maior o risco.
Fatores protetores
São menos estudados e geralmente são dados não muito consistentes, incluindo: autoestima elevada; bom suporte familiar; laços sociais bem estabelecidos com família e amigos; religiosidade independente da afiliação religiosa e razão para viver; ausência de doença mental; estar empregado; ter crianças em casa; senso de responsabilidade com a família; gravidez desejada e planejada; capacidade de adaptação positiva; capacidade de resolução de problemas e relação terapêutica positiva, além de acesso a serviços e cuidados de saúde mental. Durante uma avaliação do risco de suicídio em um indivíduo, os fatores de proteção não devem ser usados para obscurecer aqueles fatores que identificam o risco de suicídio.
Fonte: setembroamarelo.com