A continuidade do fenômeno La Niña poderá favorecer a permanência do tempo mais seco na maior parte do Brasil nos próximos meses. Confira o prognóstico apresentado pelos pesquisadores Williams Ferreira (Embrapa Café/ Epamig) e Marcelo Ribeiro (Epamig).
O Clima
Como a maior parte do território brasileiro se encontra na região tropical, o nosso regime de chuvas varia dentro de uma escala de tempo intrassazonal, que é um ciclo de 30 a 60 dias menor do que a escala de tempo sazonal, em que ocorre o fenômeno ENOS (El Niño Oscilação Sul).
Essas variações que ocorrem num ciclo menor de tempo são naturais devido, principalmente, ao sistema acoplado oceano-atmosfera, e influenciam a circulação atmosférica em toda a região tropical. Deste modo, faz-se necessário o monitoramento das atividades que ocorrem nas diferentes escalas de tempo.
O fenômeno ENOS
Como pode ser observado na Figura 1, o último índice bimestral (março/abril) multivariado El Niño/Oscilação do Sul (ENSO) foi de (-1,0) indicando a continuidade do fenômeno La Niña.
Na Figura 2 é possível verificar as anomalias de calor que ocorrem nos primeiros 300 metros de profundidade nos oceanos. Na faixa “Niño 3.4” é possível observar o aumento da temperatura a partir de março deste ano, quando uma primeira onda de Kelvin, que teve início em fevereiro em 2021, considerada fraca, alcançou essa região.
Pode ser também observado o início de uma segunda onda de Kelvin, que teve início em abril e que deve alcançar a região “Niño 3.4” nos próximos meses. A possibilidade de uma próxima onda de Kelvin mais forte do que as atuais, pode contribuir para o final do fenômeno La Niña, entretanto, tal condição ainda não é observada, indicando a possibilidade de permanência do La Niña, ainda que o fenômeno tenha se enfraquecido nos últimos meses.
O intervalo entre as duas ondas de Kelvin se reflete no atual maior valor negativo (-1,0) expresso pelo índice multivariado ENOS (Figura 1). Destaca-se que o atual comportamento de enfraquecimento do La Niña contribui para que os efeitos do fenômeno permaneçam influenciando o clima além do seu término.
As chuvas nos últimos 30 dias
Em relação às chuvas, pode ser observado na Figura 3 o volume médio registrado nos últimos 30 dias. Na região das Matas de Minas, que fica localizada mesorregião da Zona da Mata mineira e do Vale do Rio Doce, pode se observar que na porção leste choveu entre 4 e 6 mm por dia, enquanto na porção oeste da Zona da Mata e central do Vale do Rio Doce choveu entre 3 e 4 mm. No Sul de Minas choveu menos ainda, entre 2 e 3 mm por dia na porção leste e abaixo de 2 mm na porção oeste dessa região. De modo geral, em Minas Gerais, São Paulo e Paraná o volume de chuvas foi baixo.
A mesma distribuição de chuvas pode ser observada na Figura 4, demonstrando que o volume de chuvas acumuladas entre os dias 11 de abril e 10 de maio na mesorregião da Zona da Mata e na porção Sul do Vale do Rio Doce foi de até 25 mm, sendo de até 50 mm na porção central da Zona da Mata. Já no Sul de Minas foi abaixo de 10 mm na porção Leste e de até 25 mm na porção Oeste da mesorregião.
Próximos meses
Para os próximos três meses é esperado que as chuvas ocorram dentro, ou pouco abaixo, da média normal do período para os estados de Minas Gerais e São Paulo. Já no mês de agosto, espera-se que as chuvas fiquem abaixo da média nos estados de São Paulo, Paraná e na mesorregião Sul de Minas Gerais.
Também é esperado que as temperaturas fiquem acima da média do período nas mesorregiões do Triângulo Mineiro, Noroeste e Norte de Minas, Vale do Jequitinhonha Mucuri e Central Mineira. No Oeste de Minas, Metropolitana de Belo Horizonte, Campo das Vertentes e Sul de Minas é esperado que as temperaturas fiquem dentro da média do período ou um pouco acima desta. Nas mesorregiões da Zona da Mata e do Vale do Rio Doce as temperaturas poderão ficar abaixo da média do período.
Dentre os próximos três meses, junho é aquele que apresenta probabilidade de ocorrência de temperaturas abaixo da média do mês para as mesorregiões da Zona da Mata, Metropolitana de Belo Horizonte e Campo das Vertentes. Nas demais mesorregiões é esperado que as temperaturas ocorram dentro ou pouco acima da média do período.
O café
Apesar dos problemas de má formação dos grãos, que têm sido relatados por alguns produtores devido à pouca chuva que ocorreu em determinadas regiões, a continuidade do clima mais seco proporcionará menor umidade relativa do ar, fato esse que poderá contribuir com a qualidade do café que está sendo colhido nesta safra.
Considerando-se que o café é um produto que tem o seu valor de mercado estritamente relacionado com seu aspecto qualitativo, o produtor deve sempre investir em todos os processos que contribuem para a obtenção de um café de qualidade.
Para produzir um café de qualidade, com alto valor de mercado, é preciso ter cuidados especiais na colheita, no processamento dos frutos e na secagem do café.
Logo o produtor de observar os seguintes pontos:
1) a colheita deve ocorrer antes da queda do fruto, pois os frutos que permanecem muito tempo na planta ou no solo têm mais chances de se tornarem grãos pretos ou ardidos, que junto com os verdes são considerados os piores defeitos de acordo com os parâmetros de classificação utilizados para a definição do tipo do produto;
2) a escolha do ponto correto de maturação do fruto para a colheita é indispensável para a obtenção de um café de qualidade superior;
3) após colhido o café deve ser transportado o mais rápido possível para o local do processamento, evitando assim fermentações indesejáveis;
4) quando permanece no terreiro o café perde a qualidade, principalmente nos cinco primeiros dias, em razão da ocorrência de fermentações indesejáveis. Logo, recomenda-se esparramar o café sem sobreposição dos frutos e, na sequência, ir duplicando a espessura da camada dos frutos a cada dia;
5) nos primeiros dias, para não descascar o café, deve ser evitada a movimentação dos grãos no terreiro com o uso equipamentos mecânicos, tais como motos;
6) a partir da meia seca (ponto em que o fruto não adere à mão quando apertado) os grãos devem ser enleirados no máximo até às 15 horas e, se possível, cobertos por uma primeira camada de saco de juta e por uma segunda camada de lona plástica. Essa operação é de extrema relevância pois ocorre a troca de calor entre os grãos de café, assegurando a manutenção da leira aquecida por toda a noite, propriedade essa que proporciona a homogeneização da umidade massa de grão e, consequentemente, da secagem da leira;
7) o terreiro deve estar sempre exposto ao sol de modo a assegurar que o mesmo permaneça seco sob a camada de café. Tal ação propicia, indiretamente, a secagem do café na próxima virada dos grãos. Cafés esparramados em terreiros úmidos favorecem a ocorrência de fermentações indesejáveis;
8) o operador que movimenta as leiras de café deve estar atento à orientação, ou posição do sol, devendo sempre as leiras de café ficarem paralelas à incidência dos raios solares, ou seja, na mesma direção da sombra projetada pelo operador.
Finalmente, para a obtenção de café de boa qualidade, é necessário estabelecer o controle da temperatura da massa do café no secador, principalmente quando o café apresentar teor de água inferior a 33% (b.u.). Cabe destacar que a temperatura da massa de grãos de café aumenta com a redução de umidade, podendo se igualar à temperatura do ar de secagem. Assim, a temperatura recomendada para a secagem da massa de grão do café é de no máximo 40 °C.
Prognóstico
A análise e o prognóstico climático aqui apresentados foram elaborados com base na estatística e no histórico da ocorrência de fenômenos climáticos globais, principalmente, daqueles atuantes na América do Sul. Considerou-se também as informações disponibilizadas livremente pelo NOAA; Instituto Internacional de Pesquisas sobre Clima e Sociedade — IRI; Met Office Hadley Centre; Centro Europeu de Previsão de Tempo de Médio Prazo — ECMWF; Boletim Climático da Amazônia elaborado pela Divisão de Meteorologia (Divmet) do Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam) e com base nos dados climáticos disponibilizados pelo INMET(5º Disme)/CPTEC-Inpe.
O prognóstico climático faz referência a fenômenos da natureza que apresentam características caóticas e são passíveis de mudanças drásticas. Desta forma, a Epamig e a Embrapa Café não se responsabilizam por qualquer dano e, ou, prejuízo que o usuário possa sofrer, ou vir a causar a terceiros, pelo uso indevido das informações. Portanto, é de total responsabilidade do usuário (leitor) o uso das informações aqui disponibilizadas.